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A epopeia de Thionville: Meio mundo por um jogo



Luz aos esquecidos, onde aqueles andarilhos do futebol vo parar. Onde as traves esto desalinhadas e o campo mal demarcado. Onde os cachorros invadem o gramado e o VAR no foi convidado. Onde?

Parece até nome de uma história de conto de fadas, mas não é. Ou é, quase. A epopeia de Thionville tem um roteiro de filme, ainda carente de alguns capítulos para se tornar um conto fantástico. O pitch do enredo é bastante promissor: a trajetória de um time de 5ª divisão, de uma pequena cidade no interior da França, que viajou até a Oceania para jogar uma partida de Copa, se classificou, derrubou um adversário três divisões acima e agora vai enfrentar o segundo maior vencedor do torneio, o Olympique de Marseille.

O primeiro capítulo merece toda uma história à parte. A Copa da França é uma competição de dimensões inequiparáveis. Envolve milhares (sim, milhares) de clubes que são de todo território francês. A França, como nação-colonizadora que foi, possui 20 departamentos e territórios ultramarinos fora do continente europeu, vários deles na América, como a vizinha do Brasil Guiana Francesa, ou na Oceania, como a Nova Caledônia, de onde surge o Hienghène Sport, o segundo adversário na epopeia do Thionville.

Pela dimensão mundial que a Copa da França tem, envolvendo clubes de quatro dos seis continetes, excluídos apenas Ásia e Antártida, a competição tem início em um calendário anterior ao próprio calendário oficial para o futebol francês. Na Europa, a temporada se inicia nas primeiras divisões, como é normal no resto do continente, em setembro.

A Copa da França, porém, tem início em março, pois passa por uma série indefinida de pré-eliminatórias: depende, ano após ano, do número de interessados em disputar. Em 2023/24 foram precisas seis pré-eliminatórias, onde territórios como Reunião, na África, terra de Payet, do Vasco, enfrenta adversários locais, e assim vai acontecendo nos demais territórios.

Para clubes como o Thionville, amador, da quinta divisão, a história também começa nessas pré-eliminatórias. Na primeira delas, passou pelo Saint-Dié, numa não tão emocionante viagem de ônibus de 2h, entre duas cidades divididas por 170km. Mas, se era emoção que o Thionville queria, ela apareceu logo no sorteio para quando a Copa da França começa “de fato” e as preliminares são encerradas.

No confronto da oitava fase, com 89 jogos de mata-mata, o Thionville foi sorteado para enfrentar o Hienghène Sport, da Nova Caledônia. Seria cômico, se não fosse trágico: como um time amador vai bancar a viagem de seus jogadores, que sequer recebem salários, para uma viagem de quase 16 mil quilômetros? 16 mil quilômetros, para se colocar em escala, é uma viagem maior do que São Paulo a Sidney, na Austrália. Com apoio da federação francesa, os amadores de Thionville conseguiram viabilizar a viagem para o segundo jogo da Copa.

Na Nova Caledônia, o time da quinta divisão conseguiu uma vitória por 4 a 0 sobre o poderoso Hienghène. A maldade do leitor invoca o tom irônico sobre o “poderoso” Hienghène, mas só pode ser classificado assim um clube que já até disputou Mundial de Clubes – em 2019, depois de vencer a Liga dos Campeões da Oceania, mas essa é outra história.

A epopeia do Thionville, porém, só estaria começando. Depois de eliminar o rival da Nova Caledônia, o adversário no sorteio seguinte foi o Annecy, localizado na França mesmo, já numa modesta viagem de 560km. O problema, porém, agora era outro: o Annecy é um clube profissional, de segunda divisão, enquanto o Thionville é… O Thionville. Mas nossos heróis mostraram que, para quem viajou até a Nova Caledônia por um sonho, nada é impossível e como azarões venceram por 2 a 1.

No mais recente sorteio, ocorrido nesta semana, o Thionville agora caiu com o que poderia ser um dos maiores dos pesadelos (ou sonho, como foi para o US Revel). O Olympique de Marseille, segundo maior vencedor da Copa da França, terá pela frente um adversário amador, da quinta divisão.

Desta vez, nossos viajantes terão descanso: jogam em casa. Não tão em casa assim, na verdade, como não tem um estádio para comportar um jogo desta dimensão, a partida será no maior estádio mais próximo, o Saint-Symphorien, do Metz, que tem capacidade para 25 mil pessoas (mais da metade da cidade de Thionville).

Para o Marseille, que o recado já esteja dado: nunca duvide de quem viajou meio mundo “só” por uma partida de futebol.



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